24 novembro, 2015

CRIADOR E CRIATURA


CRIADOR E CRIATURA

Havia quinze minutos que estávamos em silêncio. Eu nunca imaginara que ela soubesse. Por isso a explosão em minha mente e a impossibilidade de organizar qualquer frase. Ela estava do jeito que eu sempre quis que estivesse, soprando aquele ar blasé que eu havia roubado de uma antiga namorada e impresso nos músculos faciais daquela que estava agora na minha frente com luvas de veludo, um cigarro preso naquela cigarrilha démodé, sentada em um café de uma cidade que nem vale a pena ser identificada. Ela tinha uma pinta minúscula no canto inferior esquerdo dos lábios. Eu a quisera assim porque eu sempre a amei, antes mesmo de resgatá-la do limbo. Meu amor foi o que a resgatou da não-existência.
Ela fez assim, jogou toda a informação entre o café e o croissant, entre a água com gás e a tartelete de limão, como se falasse do tempo, das nuvens carregadas e da chuva próxima. Falou como se comentasse as coisas do trabalho, a inveja das colegas pela recente promoção. Havíamos acabado de planejar uma viagem para as férias, viagem tranquila pelo interior do país, vendo os vilarejos antigos, provando da boa gastronomia, tudo para comemorar os trinta anos de união. Mas, eu não tinha o direito de me sentir enganado, eu havia ocultado tudo durante todos esses anos. Porém, o que me deixou mais perturbado foi a maneira como ela disse.
“Descobri há cinco anos, desconfiava há mais de dez.
E então o tempo foi suspenso, era como se eu houvesse interrompido temporariamente a narrativa. Eu estava impossibilitado. O mundo que eu havia criado acabara de se romper. Meu tempo foi suspenso. Os figurantes sem nome continuavam andando pelas ruas, conversando na rua ao lado, transando em algum apartamento apertado. Ela assumiu as rédeas da história. Eu acabara de ser despromovido. Depois de muito lutar contra o mal que se alojava dentro de mim, consegui perguntar.
Como?
“Foi quando eu consegui o novo emprego e você estava ainda de férias. Era o meu primeiro dia. Estava nervosa e acabei dormindo mal. Você roncou a noite toda, mais do que o normal, o que me impediu ainda mais de dormir. Mas me deixei deitada, na expectativa daquele novo mundo que me aguardava. Você sabe como sou ansiosa, de modo que levantei mais cedo e fui fazer um café. Tentei trocar umas palavras com você, sem êxito. Deixei você semi-acordado, meio que sonhando, murmurando palavras estranhas.
“Decidi não pegar o metrô, e fui caminhando até o trabalho. A manhã não estava tão fria, e eu queria me sentir viva, por isso fui a pé. Vi muita gente indo ao trabalho, saindo com suas próprias preocupações em suas cabeças baixas a fitar o chão. Notei como as pessoas eram tristes, elas que se deixaram entrar em uma rotina, da qual não poderiam sair e sem as quais já não poderiam viver. Isso era justamente o oposto pra mim naquele momento, talvez o futuro me reservasse, e provavelmente o faria, uma rotina massacrante, mas naquele momento eu me sentia uma aventureira, pronta para encarar o desconhecido. Mal sabia eu que uma reviravolta me aguardava além da esquina.
“Pude jurar que vi teu vulto em cima de um prédio, perto da avenida principal. Duas quadras à frente, vi tua silhueta atrás da cortina de um café. Chegando ao prédio onde trabalho, vi você comprando um cachorro-quente. Com vinte anos ao seu lado, acabei por me surpreender apaixonada assim, vendo você em todos os lugares. É claro, acreditei ser coisa da minha cabeça, fruto da paixão boba. Porém, isso se repetiu pela semana seguinte, e pela outra, e sem mais cessar. Todos os dias eu te deixava na cama do mesmo jeito. E eu sentia que você me seguia. Não podia ser só amor. Alguma coisa estava muito errada.
“Eu sempre fora cética, nunca acreditei de verdade em outras vidas, reencarnações, simpatias, rezas, deuses, olimpos e paraísos, você bem sabe. Sempre discutíamos muito sobre isso. Reparou que há algum tempo não discutimos mais a respeito? Eu me dei conta de que havia algo acima. E eu entendi tudo. Não antes de muito refletir e procurar a respeito.
“Eu sou tua personagem, sempre fui. Entendi porque eu não tinha lembranças da infância, que o laudo médico sobre amnésia irreversível após meu acidente de carro quando jovem era falso, que sua mulher que, segundo sua versão, tinha acabado de morrer no mesmo hospital onde eu estava de recuperação era mentira, e que aquele papo de querer ajudar alguém daquele mesmo hospital a se recuperar, pois deixaria tua alma mais tranquila enquanto ocupava a mente, era também tudo balela. Tudo era pra me fazer crer que esse mundo todo aqui é real. Você escreveu todas as linhas desse mundo, inventou esses personagens figurantes, os nossos amigos, as situações todas, tudo foi planejado, inclusive a cura do meu câncer no pâncreas, quando todos os médicos já tinham me desenganado. Era tudo artificial, mas impressionantemente sólido pra que você pudesse entrar e fazer as coisas normalmente, como uma vida comum.
Eu caíra na minha própria armadilha. No início, é claro, eu era muito atento, planejava cada passo para não dar espaço para que ela desconfiasse de algo. Tinha que ser algo perfeito, completamente arquitetado, uma realidade completamente bem construída. Anos depois, com tudo correndo perfeitamente, fui aos poucos relaxando. Eu controlei bem, no início, minha curiosidade sobre a vida dela, mas depois desenvolvi esse lado voyeur, de ficar seguindo, vendo-a agindo normalmente, interagindo, vivendo. Sim, eu sei, eu sou o escritor aqui, eu a criei, criei o mundo no qual vivemos, criei todas as outras personagens, mas meus braços não são tão longos, então, não posso controlar exatamente tudo o que se passa na vida de cada pessoa, nem mesmo na dela, mas posso mexer meus pauzinhos, como sempre fiz. Não velei mais corretamente, e dei espaço para que ela me descobrisse.
“Seria melhor que você tivesse me traído com outra mulher. Ao menos eu seria dona da minha vida. Lembra da minha depressão, que você não conseguia entender o porquê? Era justamente porque eu tinha descoberto tudo e esperava que um dia você me contasse. Aí, de repente, decidi tomar rédea das coisas, decidi me recriar, nem só você pode ser deus aqui, querido, voltei a agir normalmente, deixei de tomar os remédios, simplesmente obtive cura, e tenho certeza que você acreditou que era por você ter conversado com o psicanalista. Ledo engano o seu. Fui vivendo essa falsidade até onde dava. Descobri nesse meio tempo, que eu poderia ser sim, dona de mim mesma, mesmo sendo você o criador. Não é tão engraçado isso tudo? Eu devo a você minha existência, mas não devo a você minha vida. Foi aí que decidi te deixar. E estou fazendo isso agora.
Eu sempre temi a descoberta, sempre soube que isso pudesse acontecer. O narrador nem sempre dá conta de tudo o que acontece. Eu deveria tê-la libertado antes, seria mais nobre. Tropecei no próprio medo da solidão, essa solidão de divindade, sozinho no seu céu, olimpo, paraíso ou qualquer outro nome que lhe dê. Esse tédio eterno. Agora é ela que descobre tudo e decide sair do Éden.
“Fiz minhas pesquisas. Descobri tudo sobre você. Sua infância pobre em outro país. A imigração ilegal pra cá. O sonho de ser escritor, de ser publicado, os amores fracassados, a descoberta de poder ser um semideus. Mas muitos podem ter esse papel. Eu também posso escrever o destino, não percebeu que nesse conto, eu já assumi há muito tempo as rédeas da narrativa? Sou eu que falo, você escuta, eu estou agindo, roubei a tua história. Você me criou, mas sou eu que vivo.
“Há algo também que talvez você não saiba, você também é um personagem. Conheci o escritor que te criou lá no trabalho, ele não cai na preguiça em monitorá-los, faz uma narrativa perfeita. Ele inclusive também é criação de outro escritor, mas aceitou sua sina. Também aceito a minha. Há algum tempo resolvi brincar disso também, criei vários personagens e os fui libertando aos poucos. Lembra das horas extras no trabalho? Você não conseguia, é claro, ler o que eu estava anotando, achou que fossem planilhas, não podia vir conferir para não afetar a realidade. Criei vários leitores, todos aqueles que lerão essa narrativa também são minhas personagens. Você perdeu inclusive seu próprio conto, meu querido. Essa foi minha traição, minha vingança, meu amor, ser maior, mais nobre e mais esperta do que você.
“E você achando que era o único. Esse é o problema dos deuses e dos falsos deuses, acham que criam alguma coisa. E quando conseguem criar algo se creem gênios. Mal sabem eles que fazemos parte de um círculo vicioso de criação e destruição. E que todos nós fomos criados por alguém e criamos outros. Nada é superior ou absoluto. Estamos em uma linha, e tudo é relativo. Termine aí agora sua narrativa, digo, minha narrativa, que vou me embora.
Dito isso, deixou o dinheiro sobre a mesa, virou as costas e saiu andando. Eu perdera minha personagem, a minha preferida, a razão da minha arquitetura. Saiu rebolando e me dizendo com as ancas que esse era o fim. Olhando daqui, enquanto ela percorre a imensa quadra sem fim da capital, é como se flutuasse no universo, e desfizesse as histórias do mundo.



26 abril, 2015

JOTAGÊ NA RADIO INCONSCIENTE

Afinal, tudo não passou de uma brincadeira lançada por um jornalista polêmico ou há realmente uma conspiração em torno do possível show de João Gilberto em Maringá? Muita gente cuspiu na brincadeira ridícula, outras se tornaram uma espécie de personagem de Umberto Eco. Vários escritores se pronunciaram, escrevendo sua versão. Outros vociferaram contra mim via inbox no facebook, por tê-los citado. O texto foi à Araraquara, chegou à pós-graduação. De lá, dizem que foi levado para São Paulo, Rio e Buenos Aires. Uma fonte minha garante que Carlos Gardel teria tocado em São Paulo e que também há muito mistério em um possível show do J.G. na capital porteña. Já ouvi gente afirmando que isso tem a ver com wikileaks. Outros dizem que tudo isso seria uma conspiração alemã para a instalação do quarto reich. E eu o que sei disso tudo? O tema me obcecou, mas temo pela minha vida. Por isso vou somente escrever ficção a partir de agora, e deixo o limiar entre um e outro para os mais corajosos. Eis minha despedida. Espero que sirva para algo!
Fã que não quer se identificar teria tirado uma foto do show do João Gilberto em Maringá


J. G.
Luigi Ricciardi

                Achei que não fosse me envolver em tais historietas e nessa caça por detalhes de um possível acontecimento do qual todo mundo guarda um mistério esquizofrênico. Há semanas que não se fala de outra coisa na cidade. Méritos ao Alexandre Gaioto (o vendedor de sonhos e fábulas lado b que alimentam os sonhos dos literatos e amantes da música) que lançou o mistério típico das narrativas conspiratórias do Marcos Peres.
  
Luigi Ricciardi e Alexandre Gaioto
              Essa história toda sobre o possível show do João Gilberto em Maringá e o mistério que o cerca foi uma boa cartada do jornalistinha. A partir daí todo mundo resolveu escrever. O já citado Peres fez mais uma de suas boas histórias, citando-me inclusive, assegurando que eu teria dito que tudo não passava de uma tentativa alemã de conquistar o Brasil – como se já não bastasse a Copa do Mundo do ano passado.
Fiquei na moita esperando as versões, que tiveram seus próprios méritos, todas muito bem escritas. Nessa brincadeira, o Reginaldo Dias escreveu um dos melhores textos de sua carreira, segundo dizem. Houve versões também do Victor Faria e do Wilame Prado, Jary Mércio. Esperei algo memorialista do Oscar (de uma história desmemorizada), mas fez bem: ameaçou processar o Gaioto. Alguns dizem que o jornalista recebeu inclusive telefonemas anônimos com ameaças de morte. A ironia ácida do Ademir Demarchi se fez presente. Fiquei na expectativa de uma versão que contivesse algo relacionado ao Grêmio Maringá ou uma atmosfera noir, mas o Nelson Alexandre não se pronunciou, assim como o Marco Hruschka, de quem esperava um soneto petrarquiano ou, pelo menos, alguma máxima facebookiana. Com o André Simões já é mais difícil competir, o rapaz é devoto de São João del Gilberto (mais que de Brian Wilson?). Em uma mesa de bar, encorajei o Zé Flauzino a entrar na peleja. Sinalizou positivamente, mas desistiu em seguida – tinha dois manuscritos de futuro prêmio Nobel pra corrigir. E cadê a versão “em bordel” da Bruna Siena? De qualquer forma, mesmo que alguns não se pronunciassem, a história tomou enormes proporções.
                Achei que com a repercussão o resto do estado se interessaria. Fiquei esperando o Miguel Sanches Neto se pronunciar, resgatando algum fato histórico ou dizendo que fora tudo conspiração neonazista. Dalton Trevisan, caso decidisse entrar na brincadeira, diria que era culpa da Polaquinha, oh Glória, que frequentava o Santo Inácio. Aquela que, todos os dias, ao sair do colégio, como diz o Gaioto, prosódico maior de seu mestre, dava lambidas na melhor raspadinha da cidade. “Oh raspadinha do Santo Inácio”.  A vizinha Londrina fingiu que não era com ela – jamais daria corda para histórias inautênticas de uma terra cujo sol brilhava menos que lá.
"Coxinhas" de Bueno de Andrada
                Eu já nem lembrava disso tudo, estava focado no meu doutorado cuja vaga veio a muito custo. Uma vez por semana eu pego minha uma mochila, boto uma muda de roupas e alguns livros e vou para Araraquara estudar. Isso vai durar ainda alguns anos. Passo algumas horas na casa de um amigo que mora perto do campus, antes de ir e depois de voltar das aulas. Em um desses dias, num fim de tarde, ele me convidou para ir a Bueno de Andrada, distrito ali perto, para comer as famigeradas coxinhas de frango.
                Imediatamente me lembrei do Ignácio de Loyola Brandão dizendo, quando estava de passagem por Maringá, que a melhor coisa da sua terra eram as coxinhas. Fomos lá provar. A fila era imensa e a coxinha deveras saborosa. Minutos depois de me saciar, vejo um alvoroço no boteco: era o próprio Ignácio de Loyola que chegava para provar do prato regional. Estava de passagem pela cidade e não deixaria de degustar a iguaria. Foi atendido de pronto, com duas coxinhas e uma cerveja trincando. De imediato quis falar com ele. Os primeiros momentos foram dificílimos, todo mundo queria chegar perto do filho ilustre da cidade. Fui paciente e esperei. Por sorte, eu estava lendo o Zero e levei o exemplar para que ele o autografasse com o intuito de bater um papo com um ídolo, de pedir conselhos de um escritor canônico a um escritor iniciante.
                Quando me toquei estava sentado na mesa com ele e mais umas dez pessoas, falando de musas do cinema dos anos sessenta e cantoras de rádio – eu não conhecia quase nenhuma delas. Ele me perguntou de onde eu era, e quando eu respondi Maringá ele ficou animadíssimo. Disse que tinha passado pela cidade umas dez vezes (a primeira vez nos anos 1960, algumas outras nos anos 1970), que adorava as avenidas largas, as árvores e era louco por uma mulher – como era mesmo o nome daquela dama que fica todas as noites ali na frente das Lojas Pernambucanas?
                Disse que teve uma paixonite avassaladora por ela e que lhe fizera várias propostas de casamento. A dama recusou todas para continuar no ofício. De repente toca João Gilberto no rádio. Pra machucar meu coração. Então me lembrei da história do Gaioto e quis brincar: Por acaso você não esteve no show dele lá em Maringá, esteve? Sua expressão anuviou-se. Que show? Perguntou-me. O mais famoso que fez por lá, eu respondi, ainda brincando. Então ele me encarou por uns dois minutos, incrédulo. Sua voz parecia sair das profundezas quando quebrou o silêncio: rapaz, eu estive lá sim, mas se quer preservar sua vida, não mexa nunca mais com isso, isso foi há muito tempo e ninguém tem o direito de resgatar esse passado. E não falou mais comigo. Deu papo a uma senhorinha que vinha com o País Nenhum para autografar, pediu a saideira, bebeu-a praticamente toda, já de pé, e partiu.

Bar do Zinho
               Comecei a acreditar que tinha alguma verdade nessa farsa. Fiquei pensativo e meu amigo não entendeu nada do que estava acontecendo. Comecei a beber compulsivamente e quase perdi o ônibus por estar fora de mim. Tinha sido mordido. Agora eu teria que descobrir tudo. Não dormi aquela noite no ônibus e trabalhei mal o dia seguinte. Liguei para o Gaioto que me disse para esquecer isso, que não valia mais a pena. De madrugada eu liguei para o Peres, sabia que ele estava acordado revisando os originais do novo livro. Foi soturno e disse para eu procurar o Irineu de Freitas, pois só ele descobriria a verdade. Fui à delegacia e ninguém o conhecia. Liguei pra Santos para falar com o Demarchi, que não gostou da minha ligação naquele horário e me chamou de poetinha americanizado.
                Saí para beber e encontrei uns malucos que fumavam maconha. Passei um tempo bebendo vinho barato com eles e contando as várias versões dessa história. Acharam-me louco. Fui embora sozinho e ainda obcecado. No feriado, fui para Araraquara, dois dias antes da minha aula. Era uma tentativa desesperada de encontrar alguém próximo ao Ignácio, para tentar arrancar dele alguma informação sobre o show do João Gilberto, mas só esbarrei em histórias sem nexo. Fui parar no Bar do Zinho, onde, dizem, as coisas acontecem por lá. Eu já estava bebendo há mais de vinte e quatro horas com alguns intervalos para cochilos rápidos e vômitos no banheiro. Foi quando eu encontrei um colega da UNESP. Contei-lhe toda a história. Literato que é, aconselhou-me: rapaz, ligue pro Sérgio Sant’Anna, ele deve saber de algo.
         Eureca! Como eu não tinha pensado no Sérgio antes? O cara que tinha escrito O Concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro. Ele deveria saber de algo. Não tinha o telefone dele, mas tinha o contato do André Sant’Anna, que, de passagem por Maringá, passou o telefone pros metidos a escritor da cidade: quando quiserem. Peguei o celular, saí do bar e liguei para ele. Ainda não era meia noite. Atendeu-me com voz de sono. Não fiz muita cerimônia. Apresentei-me e contei toda a história, que ele ouviu em silêncio. Se acreditasse em mim, seria fácil de chegar ao pai dele. Esperou que eu falasse tudo para então vociferar: Você nunca mais me ligue pra falar disso senão eu te processo. Isso começou com aquele seu amigo maluco. Vocês estão mexendo onde não devem. Não vá atrás do meu pai e diga àquele seu amigo “Gaiato” que ele me paga. Desligou deixando um zunido no meu ouvido.

Kubitschek Bar e sua Noirceur
      Voltei para o bar e o Luis me grita: Luigi, caramba, hoje tem show cover aqui no bar, o show é do Jotagê, cara, dizem que ele foi amigo muito próximo do João Gilberto. Mas eu já tinha perdido as esperanças. O cara chegou, começou a tocar e eu em direção ao coma alcóolico, tentando beber o que restava no bar. O Luis tomou a liberdade de falar com o Jotagê no intervalo. Eu já estava pagando a conta para ir embora quando um soco me acertou o olho esquerdo em cheio. Você é o imbecil que tá vindo atrás de coisa antiga? Rapaz, se você não sair daqui logo eu te arranco os olhos fora. Não mexa com o João Gilberto, ouviu? Senão ele acaba com você, disse o Jotagê.
                Contei tudo isso ao Gaioto quando voltei, tomando uma cerveja entre músicas de videokê no Kubitschek. Perguntei o que ele achava, quais eram suas fontes, de onde ele tinha tirado tudo isso.
                Não falarei mais sobre isso, Luigi, vamos parar antes que alguém morra. E pra falar a verdade, já está mais para um Samba de uma nota só.



Fui beber para esquecer toda essa história